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(Foto ilustrativa) |
Pela primeira vez, em muitos
anos, dona Jane adentrou à sala sem o seu farto riso. Nunca me lembro de tê-la
visto desanimada ou sem uma perspectiva de solução, daí a minha surpresa por
aquela entrada inusitada. Há muito vínhamos discutindo a sua acuidade visual.
Nada muito restritivo, exceto para a sua própria sensação de segurança em
ambientes desconhecidos ou pouco iluminados.
Os oftalmologistas consultados
foram unânimes no diagnóstico: catarata em evolução, cujo único tratamento
seria cirúrgico. Esta é uma condição em que a opinião do cliente é fundamental.
Ninguém melhor que ele para, conhecendo a realidade dos riscos e benefícios,
decidir qual caminho seguir.
Na consulta anterior, porém,
comunicou-me que havia se decidido. Escolheu o oftalmologista, o hospital e a
data da operação, vindo apenas me solicitar os exames pré-operatórios. Este,
por ser muito breve, foi feito imediatamente. Saiu convicta, com a lista de
testes, cujos resultados ela me traria para emitir o parecer final.
Um detalhe, porém, mudou o rumo
da história. Por imposição do seu plano de saúde, foi agendada uma “avaliação
cardiológica” como condição para autorizar o procedimento.
Apresentou-se à consulta no local e data marcados, munida do meu relatório
inicial e dos resultados laboratoriais. Após algumas perguntas e um rápido
exame físico, foi lhe dado o veredicto, redigido no receituário: paciente com
94 anos, diabética e hipertensa, não está em condições cirúrgicas.
Liguei a quem acabara de emitir o
nefasto laudo, argumentando de que esta cliente nunca tivera aumento dos níveis
pressóricos ou de glicemia e que seu estado de saúde mantinha-se estável há
pelo menos duas décadas. Lacônicamente, respondeu com uma única frase: eu nunca
autorizo cirurgia para quem tem mais de 90 anos! E desligou.
Voltando à sala onde me esperava
dona Jane, expliquei que nem todos já se encontram preparados para conviver com
esta nova realidade: idosos saudáveis. Uma boa parte da sociedade ainda
confunde a idade com as doenças e, por isso, julga erroneamente as situações
individuais. Muitos chamam isso de preconceito. Prefiro acreditar que seja
apenas falta de informação adequada para a formação de um conceito. Fiz um
relatório extenso, avaliando cada componente do seu organismo e enfatizando as
suas adequadas condições de saúde no âmbito mais amplo possível.
Cerca de duas semanas após,
recebi um telefonema com o habitual riso que faltara na última visita. Entre as
inúmeras considerações sobre o quanto tinha sido bem tratada durante a operação
e de como todos se admiraram com a sua vivacidade, salientou: estou feliz por ter
conseguido fazer aquilo que eu queria fazer.
Autor :Wilson Jacob Filho é médico geriatra, professor de geriatria
da FMUSP Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo
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1 comentários:
Não acredito que seja por causa da idade e sim uma desculpa para não pagar a cirurgia. Os Planos de Saúde sim põem limites. Temos uma amiga de família que fez a cirurgia com 90 anos e nos dois olhos. Infelizmente aqui neste País é assim, precisamos brigar ou pagar do bolso, além da mensalidade do Plano.
Boa semana.
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